Top 10: colagem

Top 10: colagem

Olimpia Gaia Martinelli | 12 de jul. de 2023 11 minutos lidos 0 comentários
 

10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1: por meio desse clímax numérico que leva o nome de top 10, visa colocar as colagens mais relevantes da história da arte uma após a outros, por ordem de relevância, quero aproximar o leitor do conhecimento de uma técnica artística muitas vezes marginalizada, face à pintura, escultura e fotografia mais populares...

CIRCLE 3 (2021) Colagens de Morgan Paslier.

10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1...

10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1: por meio desse clímax numérico que atende pelo nome de top 10, que visa colocar as colagens mais relevantes da história da arte uma após a outra, por ordem de relevância, quero aproximar o leitor do conhecimento de uma técnica artística muitas vezes marginalizada, diante da pintura, escultura e fotografia mais populares. Assim, perseguindo esta intenção de caráter puramente didático, pretendo apresentar adequadamente minha curadoria, explicando brevemente as origens e especificidades da colagem, a fim de tornar o leitor mais apto a apreciar este modo de execução das obras, obtido pela sobreposição de papéis, fotografias, objetos, recortes de jornais, revistas, etc., que são colados sobre um suporte, que pode ser de diversos tipos, mas, geralmente, rígido. Do ponto de vista histórico-artístico, a referida técnica teve origem no início do século XX, período em que foi explorada na criação de múltiplas obras-primas de vanguarda, criadas, em primeiro lugar, pelos mestres cubistas Picasso e Braque e, posteriormente, também pelos expoentes do Futurismo e do Abstracionismo Geométrico, bem como pelas montagens mais complexas do Neo-Dada, do Surrealismo, do Pop e do Nouveau realisme. Esta, porém, é a história que nos contam os livros de arte eurocêntricos ocidentais, muitas vezes demasiado deficientes em explicar como, de facto, a colagem foi utilizada pela primeira vez na época da invenção do papel, ou seja, na China em 200 a. Não obstante, deve-se certamente ao mundo ocidental a invenção da fotomontagem, ou seja, a colagem feita com fotografias, técnica da qual Richard Hamilton se revela, até hoje, um dos maiores expoentes. De qualquer forma, vale notar como outros métodos de combinação de imagens também são chamados de fotomontagem, como, por exemplo, impressão vitoriana, impressão de mais de um negativo em uma única folha de papel de impressão, projeção frontal e técnicas de edição por computador. Agora, depois desta breve "lição", chegamos ao momento fatídico, pois, já carregados de noções, deixo-vos a contemplar, bem como compreender, o meu top 10 sobre a técnica em questão...

CONTENÇÃO (2020) Colagens de Emily Coubard (Mil.)


Annegret Soltau (auto-retrato).

10. Annegret Soltau (auto-retrato)

Meu top ten começa com Annegret Soltau, uma artista visual alemã cujo trabalho, puramente focado na arte da fotomontagem, tendo como tema principal o corpo e rosto humano costurados ou conectados com linha preta, marcou um marco na arte dos anos 1970 e 1980. O autorretrato de Soltau que escolhi para ilustrar esta seleção é um resumo de múltiplos conceitos-chave que se repetem na obra da artista, como, por exemplo, a combinação da ideia de linha, representada por fios, com a da figura humana, neste caso personificada pela própria Annegret. Além disso, tal combinação leva à criação de obras em que o sujeito, amarrado com os já citados fios de seda preta, gera uma espécie de “autorretrato”, neste caso capaz de unir duas épocas bastante distintas da vida da artista, manifestadas, ao mesmo tempo, em sua juventude e maturidade. Desta forma, Annegret também escreve sua história muito pessoal como mulher, visando aludir, através dos fragmentos de sua figura, aos conflitos que animam a posição marginal do “sexo justo” no contexto social, bem como às pressões e discriminações de gênero. Ao final, ao justapor as duas versões de si mesma, ela consegue ainda evidenciar as mudanças físicas e psicológicas, que o indivíduo naturalmente enfrenta ao longo de sua existência.

Hannah Höch, Cut with the Kitchen Knife Dada Through the Last Weimar Beer-Bely Epoch Cultural of Germany, 1919–1920. Colagem. Berlim: Nationalgalerie, Staatliche Museen zu Berlin.

9. Hannah Höch, Cut with the Kitchen Knife Dada Through the Last Weimar Beer-Beer Epoch Cultural of Germany (1919–1920)

Na posição número nove encontramos outra mulher, a saber, Hannah Höch, uma artista dadaísta alemã nascida em 1978, conhecida por suas colagens e fotomontagens pioneiramente políticas, construídas através do uso e combinação de imagens e textos da mídia de massa, com o objetivo de explicitar uma crítica cultural dirigida tanto aos fracassos da República de Weimar quanto aos papéis socialmente construídos das mulheres. Vale notar como suas obras exalam não apenas as visões pessoais da artista, mas dão voz a uma ideologia compartilhada por grande parte do povo alemão da época, muitas vezes animada por aquele espírito rebelde e crítico, que marcou o período entre as duas guerras, percebido por muitos como o início de uma nova era, na qual a vanguarda assumiu o papel de explicar o descontentamento. No que diz respeito à obra-prima escolhida para ilustrar o meu ranking, a saber Corte com a faca de cozinha Dada Through the Last Weimar Beer-Belly Epoch Cultural of Germany, ela representa plenamente as características estilísticas e ideais da artista descritos acima, na medida em que a obra mais famosa de Höch persegue a intenção, através de suas técnicas de síntese projetadas para reunir recortes de jornais, para desafiar os códigos racistas e sexistas que governaram a Alemanha de Weimar, tornando explícita a experimentação com uma forma de arte capaz de demonstrar como a própria criatividade pode ser circundado pela dinâmica do cotidiano da vida moderna.

John Stezaker (Retrato da capa da monografia da Whitechapel Gallery)

8. John Stezaker (Retrato da capa da monografia da Whitechapel Gallery)

Chegada à posição oito, aproveito para esclarecer a forma como, ao longo da escrita deste top 10, muitas vezes me deparei com uma procura desesperada pelos títulos das obras em questão, tanto que muitas vezes, não os encontrando, referi entre parêntesis apenas o tipo de tema retratado, demonstrando, involuntariamente, o que antecipei na introdução, nomeadamente a menor popularidade da técnica de colagem e o consequente acesso limitado à informação relacionada. Esclarecido isso, apresento brevemente a figura de John Stezaker, um artista conceitual britânico nascido em 1949, conhecido por suas criações de tons surreais, muitas vezes feitas através da técnica de colagem, tendo como tema imagens retiradas de cartões postais, stills de filmes e fotografias publicitárias. Sobretudo esta forma de trabalhar tem procurado dar vida a composições capazes de ilustrar retratos glamorosos dos anos 1950, por vezes com a presença de estrelas de Hollywood, que se misturam com imagens de paisagens, cujo efeito perturbador se pode observar, por exemplo, na colagem escolhida para capa da monografia da Whitechapel Gallery (2011), onde uma figura feminina é quebrada, ao nível dos olhos, pela presença de um escorço rochoso.


7. Eileen Agar, Pedras Preciosas (1936)

Precious Stones, obra da fotógrafa e pintora britânica Eileen Agar, capta a silhueta de um rosto masculino de perfil, que surge colado numa folha de papel branca, onde, por sua vez, é enquadrado pela presença de um terceiro suporte, que dá origem a uma margem vermelha que contorna a imagem. Voltando ao assunto principal, a figura em questão foi recortada de um livro que ilustra algumas pedras preciosas, cuja disposição precisa da grade contrasta com o contorno em parte arbitrário da efígie, espelho das tendências surrealistas da artífice, que muitas vezes se expressou através da técnica da colagem. Além disso, deixando momentaneamente de lado as descrições acima, a obra também é relevante por se tratar de um dos primeiros trabalhos de Agar voltados para a inclusão da imagem de cabeça e busto de perfil, assunto que mais tarde se tornaria algo recorrente para o artista. De qualquer forma, no caso específico desta obra, é importante observar que o rosto masculino foi modelado em parte à semelhança do marido de Eileen, a saber, Joseph Bard, que, não por acaso, era de fato um ávido colecionador de pedras preciosas. Por fim, outra fonte de inspiração para a realização de Pedras Preciosas certamente foram as moedas antigas, cujos retratos de perfil são agora representados de forma substancialmente mais lúdica, ingênua e imaginativa.


Mimmo Rotella, Euromsa, 1963. Decote.

6. Mimmo Rotella, Pepsi (1979)

Um fragmento de um anúncio da Pepsi do final dos anos 1970, colado em um suporte, ou talvez "arrancado" dele, nos leva ao cerne do Nouveau Réalism da época, um movimento contemporâneo da Pop art americana, muitas vezes concebido como sua transposição para a França, da qual o próprio Mimmo Rotella foi o maior expoente italiano. O trabalho deste último centra-se precisamente na exploração da técnica do decollage, que, cara à referida abordagem artística, era acompanhada de assemblage e ready-made, feitos com objectos adquiridos a sucateiros, como tampas de garrafas, cordas, etc. s com o uso de solventes para reduzi-los ao estágio de espuma ou apagá-los.


Richard Hamilton, O que exatamente torna os lares de hoje tão diferentes, tão atraentes? , 1956. Colagem, 26 cm × 24,8 cm. Kunsthalle Tübingen, Tübingen.

5. Richard Hamilton, O que exatamente torna os lares de hoje tão diferentes, tão atraentes? (1956)

No número cinco coloquei um ícone da técnica de colagem, como o que torna as casas de hoje tão diferentes, tão atraentes? é considerada, por muitos críticos e historiadores da arte, a primeira obra Pop da história! Esta obra prima foi criada através da união de recortes de fotografias e imagens retiradas da imprensa americana, que dão vida a um bizarro interior de uma casa, onde estão dispostos muitos objetos e alguns personagens, entre os quais certamente se destacam as feições do fisiculturista seminu, o logotipo da Ford colocado em um abajur, a figura de uma pin-up deitada em um sofá, a imagem ao longe de uma dona de casa, uma história em quadrinhos da Jovem Romanca disposta na parede, etc. o catálogo da exposição londrina This is Tomorrow, evento para o qual foi mesmo dado a conhecer a preto e branco, tanto que mais tarde, Hamilton criou também várias versões do mesmo tema, nas quais retrabalhava a composição.

Beeple, Everydays: the First 5000 Days , 2021. Arte digital.

4. Beeple, Everydays: the First 5000 Days (2021)

A posição número quatro fala-nos da fotomontagem na sua variante realizada através do recurso à tecnologia informática, ferramenta com a qual ganha vida Everydays: the First 5000 Days, uma colagem digital, destinada a justapor 5.000 imagens de temas e esquemas de cores recorrentes, capaz de criar um todo estético que, organizado por ordem cronológica, revela a presença de imagens abstratas, fantásticas, grotescas e absurdas, habilmente colocadas ao lado de acontecimentos atuais, bem como de momentos da vida pessoal. O que acaba de ser descrito interpreta o medo mais sentido da tecnologia, desejo e ressentimento em relação à riqueza, bem como a turbulência política da América, que o artista reconheceu como as principais pragas da sociedade. Por fim, é imprescindível saber que essa colagem foi colocada perto do pódio, pois obteve sucesso icônico, já que seu NFT foi vendido por $ 69,3 milhões na Christie's em 2021, tornando-se o token não fungível mais caro de todos os tempos. Sobre o criador, Michael Joseph Winkelmann (n. 1981), conhecido como Beeple, é um artista digital, designer gráfico e animador americano cuja arte usa vários meios para criar obras cômicas e fantasmagóricas destinadas a explicar comentários políticos e sociais, muitas vezes usando personagens da cultura pop como referências.

Man Ray, Dora Maar , 1936.

3. Man Ray, Dora Maar (1936)

Impossível esquecer o surrealista Man Ray, ainda mais se o tema de sua colagem datada de 1936 for justamente Dora Maar, fotógrafa, poetisa e pintora francesa nascida na Croácia, que, conhecida por seu longo relacionamento com Pablo Picasso, foi frequentemente imortalizada pelo fotógrafo americano, que costumava brincar com a feminilidade, a forma e as múltiplas exposições. Foi precisamente através deste último modo de abordagem do tema que se captou a imagem da já referida fotógrafa de sucesso, que se formou inicialmente como pintora no atelier de André Lothe, tornando-se, no início dos anos 30 e sob a influência de Man Ray, uma amante da objetiva, conhecida pelas suas técnicas invulgares e fascinantes, que lhe permitiram explorar caminhos artísticos alternativos, como a fotografia cinematográfica, urbana e de moda. Pablo Picasso, por outro lado, certamente ficou impressionado com Maar como modelo, tanto que antes mesmo de conhecê-la pessoalmente fez questão de guardar um retrato dela tirado por Ray e, mais tarde, até quis imortalizá-la ele mesmo, tanto que ela se tornou tema de algumas de suas obras-primas mais conhecidas, entre elas, por exemplo: Retrato de Dora Maar (1937) e A chorona (1937). Infelizmente, porém, esta última obra nos revela toda a fragilidade da mulher, retratada como uma figura atormentada capaz de se transformar na personificação do luto. Apesar disso, o artista espanhol admitiu que foi a melancolia de Dora que lhe deu uma inspiração digna, capaz de dar vida a figuras femininas emocionalmente poderosas, por vezes até retratadas em lágrimas.

Georges Braque, Violin and Pipe , 1913. Giz, carvão, colagem, papel, 74 x 106. Paris: Centre Pompidou.

2. Georges Braque, Violino e Cachimbo (1939)

No início dos anos 1900, artistas como Braque e Picasso começaram a usar um método chamado colagem para criar obras de arte inovadoras. Esta é principalmente a razão pela qual, um dos dois pais ocidentais da técnica artística em questão, Braque, é colocado no segundo degrau mais alto do pódio com seu Violino e Cachimbo de 1913, obra que faz parte de uma série de papiers collés, em que o artista francês colocou em primeiro plano a leitura bidirecional da mesa e da própria pintura. Esta abordagem figurativa resulta da investigação artística levada a cabo pelo Cubismo Sintético no âmbito da natureza-morta, que, neste caso particular, é composta por jornais, papéis de parede impressos recortados e colados, carvão, grafite e pastel sobre papel montado sobre cartão, suporte sobre o qual ganha vida um violino e um cachimbo, interpretados numa chave por vezes quase abstracta. Obra-prima à parte, vale a pena notar como Braque explorou a técnica da colagem para desenvolver uma consciência da interação de forma e cor no nível da pintura, servindo de exemplo para outros mestres como Jim Dine e Wayne Thiebaud.

Pablo Picasso, Violão e Copo de Vinho , 1912. Colagem, 47,9 × 37,5 cm. Nova York: MET.

1. Pablo Picasso, Natureza morta com cadeira estofada (1912)

O primeiro lugar vai para a colagem mais antiga da história da arte ocidental: Natureza morta com cadeira estofada, obra-prima datada de 1912, destinada a imortalizar a superfície de uma mesa de formato oval, coberta por um recorte de tela, na qual se encontram vários objetos, feitos por meio de intervenção também pictórica, bem como o uso de tela encerada, papel e corda sobre tela. Técnica à parte, tal obra também é importante porque foi ela quem marcou o avanço do processo de afirmação do cubismo sintético, que, posterior ao analítico, viu o artista esbanjar esforços no carcare para dar vida a uma síntese de planos, retratando-os em um único nível da tela, reduzindo os movimentos ao único instante representado. Voltando finalmente à descrição da obra, na referida colagem uma corda revela-se ao observador como uma cornija, enquanto um fragmento de juncos repropõe a imagem de uma cadeira estofada, sujeito ao lado do qual o artista coloca outros objectos apenas insinuados, por vezes fragmentados, como se quisesse evocá-los, ou dar-lhes uma representação ilusória, em vez de os descrever atendo-se ao dado real já ultrapassado.


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